quarta-feira, 4 de maio de 2011

Assassinato de Estado esvazia ideia de justiça internacional

Manifestantes agradecem ao presidente americano pelo assinato do terrorista Osama bin Laden no vizinho e rival Paquistão (Foto AP). A matéria a seguir, postada nesta quarta (04/05) no portal TERRA, é de autoria do Juiz de Direito em São Paulo, Doutor MARCELO SEMER, que além de magistrado é escritor e líder classista. Pedimos a atenção de nossos leitores para o comentário que expressamos a respeito da matéria em foco. Eis o que diz o notável magistrado:

"Osama Bin Laden era um bárbaro terrorista.

Mesmo depois de sua morte, é impossível ter compaixão ou piedade por quem, conscientemente, assumiu a responsabilidade pelo homicídio em massa de milhares de inocentes civis.

Mas nada disso oculta a realidade de domingo: seu assassinato é um ato de vingança, não de justiça.

Em 1945, com a rendição de alemães e japoneses, os aliados discutiam o que fazer com prisioneiros nazistas. Muitos pretendiam simplesmente liquidá-los, falando-se de fuzilamentos em massa. Os norte-americanos impuseram a força de sua razão, para realizar julgamentos históricos em Nuremberg.

Pode-se dizer que Nuremberg foi um tribunal de exceção, criado após os crimes terem sido cometidos. Que se constituiu em uma justiça dos vitoriosos, não dos vencidos. Ou que crimes foram delimitados após os fatos, rompendo uma histórica barreira doutrinária.

Ainda assim, realizou-se a justiça possível em um momento complexo, inusitado e de proporções até então desconhecidas. Com isso, fixaram-se bases para a construção da jurisdição internacional que se seguiria: Tribunal ad-hoc para a ex-Iugoslávia, para crimes em Ruanda, e, enfim, o Tribunal Penal Internacional.

E não estamos falando de crimes simples ou corriqueiros. A máquina de matar do Terceiro Reich assassinou nada menos do que seis milhões de judeus, além de homossexuais, comunistas e ciganos. A limpeza étnica de Milosevic aniquilou cerca de 200 mil bósnios e quase 700 mil tutsis foram vítimas na África.

Mas os Estados Unidos já não têm mais a pretensão de impor julgamentos a grandes criminosos. Nem sequer ratificaram o Estatuto de Roma, com receio de serem eles mesmos inseridos no banco dos réus.

Hoje, seu presidente vem a público se jactar de ter inserido o assassinato de um terrorista como uma das prioridades de sua gestão, e vangloriar-se de tê-lo conseguido.

Nada que seja, em si, uma novidade.

Desde setembro de 2001, a "guerra ao terror" anunciada por George Bush vem justificando todos os excessos norte-americanos.

Justificou a invasão ao Iraque, cujo pretexto de encontrar armas de destruição em massa se mostrou inverídico. Justificou a invasão ao Afeganistão, justamente para a procura de Bin Laden, e a ocupação do país por quase uma década. Justificou barbaridades cometidas com presos no Oriente Médio, como as fotos de Abu Ghraib expuseram ao mundo.

E vem ainda justificando centenas de presos jogados em Guantanamo, há nove anos sem qualquer acusação. Recente vazamento do Wikileaks apontou que a própria inteligência americana contabiliza mais de uma centena e meia de inocentes, vítimas colaterais do terrorismo de Estado.

Barack Obama galvanizou as esperanças de descompressão da era Bush. Na campanha, mostrou o quanto as mudanças eram viáveis e fez o mundo, mais ainda do que os americanos que lhe deram vitória estreita, acreditarem que outro governo era possível.

Pela expectativa criada, recebeu inclusive um inédito Prêmio Nobel da Paz por antecipação, para que se sentisse devedor dos valores que suas mensagens difundiam.

Mas, eleito, manteve a ocupação do Afeganistão, manteve seus homens no Iraque, manteve os presos em Guantanamo. Declarou uma guerra, sem ouvir o Congresso. E seu maior trunfo na eleição do ano que vem será nada menos do que a cabeça de Osama Bin Laden jogada ao mar, como resultado da guerra ao terror que havia reeleito Bush.

Era isso que o "Yes, we can" queria dizer?

Americanos eufóricos saíram às ruas na madrugada de segunda para comemorar a morte anunciada do terrorista, como faríamos se tivéssemos ganho uma Copa do Mundo.

Não era apenas alívio - era pura satisfação. Mas esse mórbido sentimento de regozijo dificilmente tornará os Estados Unidos um país mais seguro ou mais feliz para se viver.

A comemoração pode purgar o sofrimento de um império ofendido por um grupo de lunáticos terroristas, mas a questão é saber: o que irá ao mar junto com o corpo de Osama?

A delicada e custosa construção da justiça internacional, desnecessária diante do assassinato de Estado.

A vantagem moral que a civilização impõe à barbárie, prejudicada na absorção pelo poder do modus operandi do terror.

A evolução de séculos que enquadrou a vingança dentro dos conceitos e dos limites do direito, estabelecendo as noções de pena e processo.

Difícil crer que a morte de Bin Laden resolva os problemas do terror. Os próprios norte-americanos alertam para possíveis e iminentes represálias.

Obama está se transformando rapidamente em Bush e isso provavelmente lhe renderá uma reeleição segura.

Pode estar realizando o desejo de milhões de norte-americanos, à moda de seu antecessor: dar uma lição no terror e mostrar a todos que não há limites ao poder dos EUA.

Mas não vai conseguir que o mundo acredite que faz guerras em nome da paz e que assassina em nome da justiça.

Marcelo Semer é Juiz de Direito em São Paulo. Foi presidente da Associação Juízes para a Democracia. Coordenador de "Direitos Humanos: essência do Direito do Trabalho" (LTr) e autor de "Crime Impossível" (Malheiros) e do romance "Certas Canções" (7 Letras). Responsável pelo Blog Sem Juízo. COMENTÁRIO "O EVANGELHO ETERNO": O livro do Apocalipse em seu capítulo 13 anuncia o breve e futuro estabelecimento de 2 poderes que exercerão domínio planetário em futuro próximo. Por meio de símbolos de animais não existentes na fauna terrestre estão delineados os característicos desses dois poderes absolutistas, cuja autoridade não poderá ser contestada. É a repetição da História. Roma papal foi estabelecida com poder absoluto - religioso e político - sobre as nações, no passado. Suas decisões eram sem apelação. Esse poder, exercido por 1.260 anos (entre 538 e 1.798) teve início e foi armado com o braço civil dos francos, por meio da conversão de seu rei Clóvis, e de seu exército. A mesma França o destronou séculos depois, em 1.798, por seu imperador Napoleão Bonaparte. O poder papal começou a renascer quando foi-lhe restituído o reino em 1.929 pelo Tratado de Latrão, quando politicamente foi reestruturado. A partir de então sua ascenção tem sido irrefreável. Quando ela atingir o seu clímax o mundo contemplará novamente o advento da intolerância religiosa e as fogueiras da perseguição medieval serão novamente acesas. E não adianta dizer que isto é hoje impensável num mundo de total liberdade e pleno exercício dos direitos fundamentais. Basta que se olhe para os recentes genocídios na Alemanha Nazista, na Bósnia, na África e no Iraque, dentre outros. Mas o artigo acima transcrito se destaca em importância quando traça um paralelo entre a palavra e a ação manfesta pela nação norte americana. Os Estados Unidos da América, o maior poder já manifesto na história humana, cumpre todos os requisitos manifestos na profecia. Os direitos fundamentais do homem e as liberdades individuais, ou seja, o estado de direito, foram os alicerces em que a grande nação foi erigida. Foram simbolizados na profecia como "dois chifres de cordeiro". Entretanto, pisando aqueles princípios fundamentais, acabou falando como o "dragão". E é onde chamamos a atenção para as diferenças entre o que aconteceu no passado, com o Tribunal de Nuremberg, que julgou os assassinos de milhões de pessoas e o tribunal das consciências não apenas do presidente norte-americano e de seu povo, mas de todas as pessoas que comungam com a execução sem julgamento perpretada no Paquistão. A consciência de quem quer que seja não é e nem pode ser o foro adequado para o julgamento, condenação e execução de ninguém. A matéria que deu origem a este comentário inicia assim: "Obama Bin Laden era um bárbaro terrorista". Ninguém tem dúvida disso. Mas, executá-lo sem julgamento parece um retorno à barbárie, um nivelamento por baixo. É apenas uma antevisão dos horores e desmandos que podemos vislumbrar no horizonte cinzento do porvir. Olhando estarrecidos para Abu Ghraib e Guantanamo e contemplando as apoteóticas comemorações do desfecho de Abbottabad, perguntamos-nos perplexos: Eles podem fazer isso? E a triste e preocupante resposta: YES, THEY CAN!

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